segunda-feira, 20 de junho de 2011

Artigos: Legalidade no Uso das Imagens Digitais / Legal Issues in the use of digital images

Márcia Pereira Simões
(Professora Auxiliar de Odontologia Legal e Deontologia Odontológica da FO/UFRJ-RJ e Especialista em Odontologia Legal pela FO/UFRJ)

Carlos Henrique Silva Pedrazas
(Especialista em Estomatologia pela FO/UFRJ)

RESUMO
            Como protocolo, inúmeros cirurgiões-dentistas costumam registrar fotograficamente alguns dos tratamentos que realiza, alguns dos resultados que obtém, assim como fazem requerimento de exames complementares. A maioria destes, hoje em dia, faz uso de imagens digitais. É neste contexto, que o presente artigo visa apresentar a validade das imagens digitais utilizadas na odontologia, tanto para diagnóstico como para registro de resultados, e que poderão ser de grande utilidade no meio jurídico.
Palavras-chave: imagem digital; odontologia legal; documentação clínica.
ABSTRACT
            As a protocol, a lot of dentists are used to take pictures of some treatments that they do, some results of those treatments and requirements of complementary exams. Nowadays, most dentists have been using digital images. In this context, the purpose of this paper is to present the validity of the digital images used in dental practice, as for diagnostic as for results registry, which can have a great value on the court of justice.
Key words: digital image; forensic dentistry; clinical documentation.


INTRODUÇÃO
Com o avanço da tecnologia e da multimídia, imagens digitais surgem e com elas as dúvidas no concernente à legalidade de sua utilização, assim como seu aspecto dentro da ética na clínica diária do cirurgião-dentista. O profissional pode ou não documentar fotograficamente situações clínicas quando desejar? Ou se a fotografia é digital, ela terá valor legal? São perguntas feitas por qualquer profissional da área de saúde que se preocupe com o respaldo legal de suas ações.
            Imagens sempre foram utilizadas nos setores médico-odontológicos, sendo de extrema importância para o diagnóstico, para as documentações científicas e para fins didáticos8. É difícil imaginar como seria uma aula de estomatologia, ou de qualquer procedimento clínico com base em desenhos. Muito menos fazer um diagnóstico de lesão periapical sem estar embasado de um exame imageológico, no caso a radiografia periapical.
            As imagens odontológicas são divididas em dois grupos básicos: as realizadas como exames complementares tais como a tomografia computadorizada, ressonância magnética, ultrassonografia, radiografias, entre outras e as realizadas com a finalidade de registro clínico, que são as fotografias.
            Até muito pouco tempo atrás, as imagens eram acondicionadas em envelopes e fichas que se tornavam um problema para as clínicas com grande clientela, pelo espaço que ocupavam. No entanto, tudo se tornou mais prático quando a possibilidade da digitalização da imagem se concretizou. As imagens tradicionais passam a ocupar pequenos espaços, sendo armazenadas na forma de arquivo de computador com fácil acesso de busca. Surgem os aparelhos radiográficos e câmeras fotográficas digitais que respectivamente possibilitam uma exposição menor à radiação e um menor percentual de falhas nas fotografias8.
            A documentação fotográfica já faz parte do sistema legal e sua utilização pode definir sentenças tanto no foro civil quanto no criminal, principais áreas da justiça onde o cirurgião-dentista participa dos processos, seja como réu, como acusador ou como perito.
            A fotografia é um dos mais importantes protocolos aplicados à odontologia legal, sendo considerada como prova em diversos tribunais5. Afinal, é assim que o profissional pode registrar a qualidade de adaptação de uma prótese, o ajuste de uma restauração, o antes e depois de um procedimento estético e em qual condição odontológica o paciente chegou na clínica ou consultório1, 7.
DISCUSSÃO
            Segundo VANRELL7, uma boa fotografia é fundamental para preservar a prova quando documentada em filmes sendo nestes casos testemunha silenciosa, incorruptível e imarcescível dos fatos. O autor não faz menção às fotografias digitais, mas também não as condena. No mesmo contexto, nos faz pensar que se o profissional de saúde, médico ou cirurgião-dentista, não possui a fotografia ou até um exame imageológico, a evidência de uma possível defesa perante os tribunais é perdida5.
            No Código de Ética Odontológica4, nenhuma menção é feita sobre poder ou não tirar fotografias. Apenas encontra-se escrito, que os retratos do paciente não podem ser exibidos nos meios de comunicação sem a autorização do mesmo. Além disso, se considerarmos que a imagem do paciente é sigilosa, pode ser considerada infração ética a revelação da imagem odontológica, seja ela fotográfica ou radiográfica, sem justa causa. No entanto, o Código de Ética Odontológica4 atualmente em vigor, não considera infração ética a quebra do sigilo profissional por apresentar fotografia do paciente nos tribunais, quando houver necessidade do cirurgião-dentista defender seus interesses legítimos.
            Quando se fala sobre fotos digitais, muitos profissionais desavisados podem pensar que por ser uma imagem manipulável, ela perde sua validade jurídica. De acordo com o Código de Processo Civil3, lei 585869 de 11 de janeiro de 1973, Art. 332, “todos os meios legais, bem como moralmente legítimos, ainda que não especificados neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou defesa.”, o que por não excluir a imagem digital, a considera legítima.
            Ainda no Código de Processo Civil3, no seu Art. 429 encontramos: “Para o desempenho de sua função podem o perito e os assistentes técnicos utilizar-se dos meios necessários, ouvindo testemunhas, obtendo informações, solicitando documentos que estejam em poder da parte ou em repartições públicas, bem como instruir o laudo com plantas, desenhos, fotografias e outras quaisquer peças”. Visto que as imagens digitais, como forma de registro, não são expressamente vedadas e que ainda podem ser incluídas em “outras peças”, é admitido seu uso nas cortes.
            Cabe afirmar, que se formos colocar em questão a realização de ressonância magnética, tomografia computadorizada, todas imagens digitais, fica com semelhante validade, a fotografia digital. Diversos setores do governo e da iniciativa privada fazem uso de arquivos e imagens digitais, como a informatização do Congresso Nacional e seu sistema de votação, a Receita Federal, o INSS entre outros, que dão veracidade às informações digitais.
            Sendo válido o uso de fotografias digitais em odontologia, os exames imageológicos que têm que ser devolvidos mediante requerimento do paciente, podem ser duplicados fotograficamente de maneira mais fácil.
            Ainda que seja levantada a suspeita de falsificação ou manipulação da imagem digital, o que também é possível em imagens convencionais, vide as fotomontagens, esta não perde seu valor legal. Somente após constatação de falsificação da imagem por perito, cuja avaliação é solicitada pelo juiz em caso de dúvida, é que a imagem digital poderá perder seu valor legal.
            Considerando a fotografia do paciente como parte do tratamento ou parte do planejamento, tem-se que esta só poderá ser realizada mediante autorização assinada do paciente a ser fotografado. É bem verdade que, o cirurgião-dentista poderá negar-se a realizar o tratamento caso o paciente não autorize a documentação fotográfica, em situações onde se julgue necessária, mas este impasse, pode acabar por levar a um conflito no relacionamento profissional-paciente.
            Conforme o Art. 6, inciso III e Art. 31 do Código de Defesa do Consumidor2, é dever moral e jurídico a boa comunicação entre o prestador de serviços, no caso o cirurgião-dentista, e o consumidor, no caso o paciente, devendo todas medidas a serem tomadas anunciadas claramente desde a primeira consulta e somente se ambas as partes estiverem de acordo, o início do tratamento poderá ser feito. Mudanças ou intercorrências poderão ser feitas antes ou durante o tratamento se assim o paciente preferir. Os exames imageológicos e fotográficos deverão estar previstos no planejamento.
CONCLUSÃO
            As fotografias e imagens convencionais têm seu valor legal bem estabelecido. Assim sendo, em virtude da inexistência de leis específicas que invalidem o valor da imagem digital, o profissional da área de saúde poderá fazer uso destas imagens tanto com objetivos de diagnóstico quanto por motivos de documentação com finalidades jurídicas.
            Cuidando apenas para não cometer infrações éticas no concernente à exposição inadequada da imagem do paciente sem prévia autorização, o médico e o cirurgião-dentista principalmente, ficam livres para exigir a realização de imagens, fotográficas ou radiográficas, se assim julgarem necessário para o melhor tratamento do paciente. Quanto ao armazenamento destas imagens, ele poderá ser feito em pastas ou em arquivos de computador se assim o desejar, já que as duas formas são legalmente aceitas.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
  1. BARROS, O.B., Como o cirurgião-dentista deve orgarnizar-se para evitar processos. São Paulo: Raízes, 1998. 103p
  2. BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Iglu, 2002. 186p
  3. BRASIL. Código de Processo Civil. São Paulo: Saraiva, 2003. 1120p
  4. BRASIL, CONSELHO FEDERAL DE ODONTOLOGIA. Código de Ética Odontológica. Rio de Janeiro: C.F.O., 2003. 24p
  5. STIMSON, P.G. e  MERTZ, C.A. Forensic dentistry. Houston; CRC Press, 1997. 320p 
  6. TOWSLEY, D. Et al., Ethical and legal issues for imaging professionals. St Louis; Mosby, 1999. 269p
  7. VANRELL, J.P., Odontologia legal e antropologia forense. Ed. Guanabara, 2002. 365p
  8. WATANABE, P.C.A. e cols., Estado atual da arte imagem digital em odontologia, Rev. Assoc. Paul. Cir. Dent.. 53(4):320-325, jul./ago., 1999 

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